terça-feira, 20 de julho de 2010

Vida privada

Creio que já li pelo menos duas vezes João Pereira Coutinho a falar do direito à vida privada como uma conquista do lado judaico-cristão da civilização ocidental, isto quando surge algum escândalo que envolva figuras públicas. Sendo eu cristão, sempre desconfiei desta opinião. Sim, acho que a intimidade deve ser um espaço reservado a pouca gente, onde acontecem coisas de natureza que não é domínio público, mas longe de mim pensar que a intimidade é um espaço de ética à la carte, que só à própria pessoa diz respeito. Também a intimidade está sujeita ao juízo de Deus, logo, sujeita a ser divulgada, criticada, e usada na avaliação de uma pessoa.
Suponho que deva chocar qualquer não-cristã que na Bíblia, os critérios de selecção das pessoas que desempenham ministérios na igreja não se fiquem pela própria pessoa, e que se estendem à sua família (o que para muita gente já é invadir o domínio privado).
Do que li o Anticristo, o Nietzsche também vê o cristianismo como invasor do espaço privado. Diz ele sobre Deus que "Não faz mais do que moralizar, rasteja na caverna de todas as morais privadas, torna-se o Deus de toda a gente, o Deus da vida privada, torna-se cosmopolita...". (ora cá está um inimigo da vivência integral da fé). Acredito que Deus, o real, é mais ou menos isto. Deus que incomoda, porque não encontra fronteiras para exercer o seu senhorio, nem mesmo as "morais privadas", que são um pouco como aquelas fronteiras em linha recta dos países africanos, forçadas e nada naturais.
Aos que procuram aumentar a popularidade da tradição judaico-cristã resgatando elementos aqui e acolá de coisas que hoje ainda consideramos boas, não encontrarão na sacralização da vida privada a melhor aposta.

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